Na abertura, as três “Marias” são representadas por marionetes inseridas em mini cenários com elementos cheios de cores, luzes e texturas, baseados em um estilo over e pop, presentes na estética do folhetim. A estória da vinheta resume a trajetória das vidas das personagens, do borralho ao estrelato, em um dinâmica e refinada animação tridimensional, com transições surpreendentes e uma riqueza de detalhes.
Em entrevista exclusiva ao Televisual, Alexandre Romano, diretor de arte responsável, revela todo o processo de criação e os desafios para construção dessa divertida abertura:
Entrevista: Alexandre Romano [TV Globo]
Televisual – Como surgiu a ideia de trabalhar com animação para abertura?Alexandre Romano - Na primeira reunião de briefing, a diretora Denise Saraceni nos disse que gostaria de trabalhar com a arte dos Gêmeos, artistas do graffiti. Tivemos um encontro bem legal com eles e discutimos as possibilidades de integrar o estilo da pintura deles com animação que seria produzida por nós da Videographics. A Denise queria uma abertura colorida e alegre que representasse o universo brega/pop das empregadas domésticas e o trabalho dos Gêmeos. Além de maravilhoso esteticamente, sempre mostrou uma visão legal da periferia do Brasil. Estávamos todos bem empolgados, nós por trabalhar com eles e eles por fazer sua arte em movimento para televisão. Trocamos referencias e algumas ideias. As possibilidades eram muitas, mas eles tinham uma exposição para montar em Los Angeles bem no meio do processo e só voltariam um mês antes de estreiar a novela. Portanto combinamos que eles iriam nos mandando alguns desenhos aos poucos de lá e ficaríamos trocando figurinhas de longe.
Quase um mês se passou e o prazo foi encurtando, pois nesse meio tempo eles tiveram um problema com o envio das obras para exposição e tiveram que refazer tudo de lá e infelizmente tiveram deixar o projeto da novela. Neste momento tínhamos pouco mais de 2 meses para criar do zero uma nova idéia e finalizá-la. Foi aí que sugerimos uma animação em 3D com uma estética de teatro de bonecos e cenários estilizados baseados na riqueza de referencias, que já estávamos pesquisando, desse universo brega/pop.
Concepts Ilustrados
Televisual - As três personagens principais foram representadas através de marionetes. Conte um pouco do motivo dessa analogia.
Alexandre Romano - A primeira coisa que pensamos foi que a abertura tinha que se divertida. Surgiram algumas ideias de trabalharmos com objetos reais montados como maquete. Mas poderia ficar muito frio para o clima de uma novela das 19h, cheia de humor. As bonequinhas nos possibilitariam entrar no ambiente da história das 3 marias, mostrando um pouco de sua trajetória, desde empregadas domésticas até o super estrelato do brega music. Tivemos a preocupação em passar a ideia de caos visual e exagero presentes nessa estética onde o mais é mais e o improviso predominam. Desde o figurino até a decoração de casa. As bonecas precisavam ser ao mesmo tempo bonitinhas, pop e artesanais. Os movimentos simples e quase mecânicos trariam um diferencial estético e acrescentaria personalidade à abertura. Uma referencia legal veio daqueles cachorrinhos de cabeça de mola que taxista adora colocar no painel.
Personagens “Empreguetes”
Televisual - Apesar da estética de marionetes, toda animação foi produzida em 3D. Foi cogitada a possibilidade de trabalhar realmente com marionetes reais?
Alexandre Romano - Pensamos inicialmente em usar a riqueza de materiais, objetos inusitados e numa forma de montarmos e gravar tudo isso de forma criativa e divertida. Se fossemos usar personagens e cenários reais, stop motion ou marionetes o tempo para se produzir isso com a qualidade e complexidade que queríamos seria inviável ou limitaria muito o produto final. Em 3D apesar de termos pela frente todo o conceito dos personagens e dos cenários, storyboard, busca de texturas e referencias reais, pudemos ir estudando todo o funcionamento da abertura e aos poucos irmos refinando. Além de termos mais controle sobre as proporções de objetos, luz cor e tudo mais. É um processo que depende da sensibilidade de cada artista, pois apesar de trabalharmos com bastante tecnologia tudo é feito à mão usando o computador como ferramenta.
Storyboard
Televisual - A abertura traz basicamente a trajetória das “empreguetes” em famosas artistas. Conte um pouco do processo criativo desse projeto.
Alexandre Romano - Desde o início não queria que a abertura fosse mais um desenho animado em 3D ou um passeio de camera sobre objetos ou algo com recortes em 2D. O desafio e a vontade de fazer algo diferente do que já havíamos feito e a estética do “tecno-brega-super-over” das empreguetes foram se misturando com outras referências e acabamos chegando a esse conceito de teatro em caixinhas. A ideia era ter uma espécie de carrossel visto de dentro para fora, com os cenários se encaixando e montando, com as meninas seguindo seu destino. Começamos a pensar como funcionariam os movimentos: o que limitaríamos para ficar mecânico sem ficar chato, se a camera seria contínua ou não e como funcionariam a perspectiva e ângulos de camera. Já no 3D fizemos um estudo bem básico disso tudo e fomos entendendo o que aconteceria como se estivéssemos num ambiente real com cameras de verdade filmando uma miniatura. Isso foi essencial para chegarmos no formato. A partir daí eu e o Renan de Moraes fomos criando o roteiro e um pré-storyboard. Apresentamos internamente em conjunto com as referencias visuais das texturas e objetos, tudo com muito brilho, lantejoulas, borboletas, neon e tecidos estampados. Com a ideia aprovada, chamamos o amigo ilustrador e cartunista Daniel Og para nos ajudar nos conceitos finais das bonecas e dos cenários e fazer um storyboard mais detalhado. Ele ficou uns dias aqui com a gente desenhando vários estilos para as bonecas. Tínhamos como referencia desde animé até a boneca nega-maluca artesanal. Fomos até o mercado popular do Saara e trouxemos tudo quanto é buginganga luminosa e com brilho, tecidos, flores de plástico borboletas e mais borboletas. O que não serviu diretamente como textura usamos como referencia. Fotografamos tudo e partimos para a modelagem no cenário já pré-animado. A música e o clipe de “Ex Mai Love” da Gaby Amarantos e toda seu maravilhoso visual também contribuiram muito pra entrarmos no clima. O legal desse projeto é que desde o início sabíamos que essa mistura de referencias tão diversas só poderia resultar em algo pelo menos inusitado.
Story Reel
Modelagem 3D
Iluminação e Texturização
Elementos de Cena
Televisual - Como foi o processo de concepção da marca e a integração com a animação.
Alexandre Romano - O logo foi inicialmente desenhado a traço em 2D no Illustrator, pelo designer Rodrigo Gomes, que geralmente faz os logos aqui na Videographics. A idéia era simular um logo exagerado de artista da brega music, precisava ter cara de show e ser bem carregado nos brilhos. Peguei o traço de 2 versões diferentes que ele desenhou e adaptei pro desenho final para depois “layoutar” o volume textura e cores no photoshop. Apresentamos à diretora que pediu para exageramos ainda mais nos brilhos e nos elementos brega, fomos soltando a mão e um microfone cravejado em diamantes e bastante purpurina depois foi aprovado. A integração com a animação da abertura foi simples uma vez que a cena final era de um mega show sem as paredes das caixinhas, mostrando que o sucesso das empreguetes não tinha fronteiras. O logo caiu perfeitamente no telão do palco com as luzes do seu background projetadas.
Construção da Marca
Televisual - Quantas pessoas foram envolvidas nessa abertura?
Alexandre Romano - Somos 7 pessoas fixas na equipe de animação e computação gráfica, mas apenas 4 ficaram direto nessa abertura, mesmo parando para resolver outros trabalhos quando nescessário. Estávamos no meio de lançamento da nova programação o que deixou ainda mais emocionante, hehe. Para que desse tempo e não comprometêssemos a qualidade que queríamos no trabalho final amarramos o máximo possível o roteiro e depois chamamos o Daniel Og que trabalhou na fase inicial dos conceitos. Gastamos um bom tempo nessa primeira fase pois tinham várias soluções para darmos nas transições e tudo teria que ser viável para o prazo. Em seguida o trabalho foi acontecendo em paralelo, o Fabricio Duque modelou e texturizou as personagens principais, o Gus Duval montou os cenários e animou os objetos de cena, o André Santos também trabalhou na modelagem de outros cenários, Renan de Moraes animou as personagens em todas as cenas, o Jonas Assis e a Carolina Miranda recortaram e trataram as texturas e eu fui iluminando e texturizando peça por peça, dando look final e montando as cenas na composição. Mais pro final todo mundo foi fazendo um pouco de tudo. São muitos detalhes e muita coisa dá errado no meio do processo e precisa ser refeita ou corrigida, mas no final, depois de muitas noites mal dormidas, o resultado é compensador. E por fim, a confiança do nosso gerente Alexandre Pit na equipe e sua aposta nas inovações foi essencial para que tudo fosse possível.
Abertura
Ficha Técnica
Ano: 2012Canal: Rede Globo
Direção Executiva: Alexandre Pit
Direção: Alexandre Romano
Direção de Arte: Alexandre Romano
Computação Gráfica: Alexandre Romano, Renan de Moraes, Gus Duval, André Santos, Jonas Assis, Carolina Miranda e Fabricio Duque
Animação: Renan de Moraes, Gus Duval, Fabricio Duque, Alexandre Romano e André Santos
Concept e Storyboard: Daniel Og
Design da Marca: Rodrigo Gomes
Trilha Sonora: “Ex Mai Love”, por Gaby Amarantos
Direitos Reservados: TV Globo